sábado, 29 de agosto de 2009

...


Eu olhei para ele e pude sentir-me fragmentado. Vago, eu sei. Mas era exatamente como me sentia. Incapaz de finalizar qualquer frase, qualquer pensamento. O que não saiba talvez - além das insanidades cometidas graças aquelas vodkas a mais em seu aniversário - é que tal sensação não me faz incompleto. Sim, pois todo pedaço que tenho de mim está em seu lugar, alguns explícitos, outros tão ocultos que chego a duvidar de suas respectivas existências. Espasmos. A vida tem destas coisas meus caros. O espasmo que foi aquela mensagem de celular... ou aquela aparição quase fantasma diante a portaria do seu prédio... Aonde quero chegar? Entre hesitante e confiante, o que me move são rictos, músculos involuntários de uma mente entre o feliz e o amaldiçoado. Mas se é para crer, que seja para o bem, para o positivo. Não que eu creia facilmente em frases magníficas de auto ajuda. Em momentos fáceis elas podem revelar-se intensamente verdadeiras.


- Mas que porra é esta de papo auto ajuda?
- Sei lá, estou seguindo, esperando que isto me leve a algum lugar.
- E onde este lugar? Senão em você mesmo?
- É, tá certo. Você é tão bobo, mais do que eu.
- Tsc, tsc. As vezes te desconheço...
- Porque este mal humor todo? A gente só está...
- Ah, não faz mal, me dá um beijo vai?

Eu não olhei para ele, mas abracei-o, coloquei minha mão no meio de suas pernas e beijei-lhe os lábios timidamente, ainda incerto se devia fazê-lo. Mas qual beijo não tem uma desmedida carga de incerteza? Um casal de noivos no altar, talvez? Ou o talvez seja a ocasião, a cerimônia para os amantes um agravante de toda felicidade e maldição?
Certas coisas batem pelos poros. Sim, não posso negar. Seu beijo é uma ponte. Exatamente, sem eu te amo, ou adeus, ou mesmo um telefonema. Este estar fragmentado é o que sinto pela noite me corrompendo a direção. Guiando meus olhos para onde quer que seja. O movimento dos teus braços tão fortes. O peito arfando sem querer.

Instantâneo. Disparei duas vezes.
Com outras aparições, com a mesma noite repetindo-se pela manhã na cama ao lado. Nestes instantes eu senti minha língua e dedos gigantes. Ah, que nada, pára e pensa. Levanta e faz barulho lá na sala. Daqui a pouco ele vem.
- Ele quem?
- O seu ciúme, por exemplo.
- ...
- Uma paixão que dê certo seria melhor.
- Eu não sirvo?
- Não, você não existe.
- Ele é muito agressivo comigo. Tá vendo?
Foi um soco, uma mordida. Mas foi também permissivo, gentil e carinhoso.
- Sou sim, mas é só...

Então ele aparece, aquele zé mané com cara e cú inchados - deve ser de tanto chorar e dar - este voz molenga. Não é coisa de macho que se imponha. Você precisa dar um jeito nisso. Como? Sei lá, aperta os bagos dele!
E nada.
Que porcaria de literatura é esta? Narrando assim, sempre da mesma forma, verdades e devaneios.

- Tá vendo? Já cheguei a algum lugar.
- Ai ai.
... somente uma forma de manifestar apego ainda que resistindo a ele.
- Isto precisa ser revisado.
- Ei! O que é isto? Você não é meu editor... Não interrompa minha narrativa!
- E você, pensa o quê? Que pode sair por aí fazendo merda só prá ter verdades prá narrar depois?