sexta-feira, 28 de agosto de 2009

NOITE



Parte I


Com os olhos fechados, ainda vejo focos de luzes piscando. Batidas e levadas, calor nas mãos. Um inquieto delírio nos ombros. Bom, muito bom. Assim, sem mais nem menos? Do que você está falando? Um empurrão. Latência em pequena multidão. Corro, sem destino certo. Giro, rodo, um movimento estelar nos ossos estalando. Porradas na madrugada. Violência, um maço de cigarros que se fuma sem vontade. Uma dúzia de cervejas e sua cara sempre no banheiro. Desmentindo promessas juvenis de uma paixão igualmente pueril. Não se espera nada da sorte para que ela aconteça. Mas teve aquela que me arruinou, exatamente quando se confirmou. Eu desejei tanto, tanto, tanto... que cheguei a duvidar. E hesitei. Na anterior não. Fui até o fim de um amanhecer melancólico, frenético nas articulações de uma cidade ambíguamente confusa. Confissão. Me livra deste clichê absurdo. Me dê uma droga de garantia para a semana que vem. Giro, rodo, quantas vezes? Sem medo do ridículo. Ah, que nada, somos tão ridículos em nossos rituais por natureza meu bem. Somos feitos de silêncio e sons. Fomos condenados por nós a uma liberdade eterna, a uma inútil crença de que podemos ser aquilo que quisermos. Que nada pode nos deter senão a morte. A morte virá à noite? Ou será numa tarde quente? É certo que ela virá. e que seja breve, como o intervalo de breu e luz desta pista. Relâmpagos de toda urgência contemporânea. Trovões de um passado próximo. Ontem á noite. E esta continuidade a qualquer preço. Querem uma história? Descendo para a pista, vi ele e seu amigo ali, quase indo embora. Dançava. E vi que retornando, procurava por mim. Puxei-lhe pela camisa. Olhei de perto, para sentir-lhe o cheiro. E foi neste instante nosso primeiro beijo. Música acelerada em pulsação estagnada. Me leva para casa. Me leva para outro lugar. Me leva para qualquer lugar. Mãos dadas por alguma outra manhã. Telefone trocado por alguma outra manha. Outra dose. Sua cara branca e bêbada sob a vermelha luz do bar. Violência na tv. Tira esta mão daí. Põe aqui, agora relaxo, na noite que vem será diferente. Sempre é.